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terça-feira, 7 de fevereiro de 2012



Pesquisa da UFMG mostra que apenas 1,7% dos casos de violência doméstica são denunciados às autoridades


EUGÊNIO MORAES/ARQUIVO
violência
Só no ano passado, a Delegacia de Mulheres de BH atendeu a 28 denúncias de tentativa de homicídio


A inexistência de meios para monitorar os acusados de crimes contra as mulheres deixa as denunciantes vulneráveis à fúria de seus algozes. Temendo que os agressores concretizem as ameaças, muitas vezes de morte, as vítimas preferem se calar a pedir ajuda à Justiça. Essa é a avaliação da psicóloga Marlise Matos, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ao analisar o pequeno número de denúncias de violência doméstica que chega às delegacias. “Apenas 1,7% dos casos são comunicados à polícia na Região Metropolitana de Belo Horizonte”, afirma.

Doutora em sociologia e professora do Departamento de Ciências Políticas da UFMG, Marlise ressalta que, sem serem monitorados, os acusados não cumprem as medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha, como manter distância das vítimas. Em represália às queixas registradas pelas companheiras, parte deles comete atrocidades, como a ocorrida na madrugada da quinta-feira passada, em uma mansão em Nova Lima. A procuradora federal Ana Alice Moreira de Melo, de 35 anos, que havia denunciado a ameaça de morte que sofrera do marido, o empresário Djalma Brugnara Veloso, de 49, foi assassinada por ele. Djalma tinha sido notificado pela Justiça, horas antes, a não se aproximar da mulher.

“O ciclo da violência começa com uma agressão verbal, que evolui para um tapa e uma arma que é mostrada pelo agressor. Quando a vítima denuncia, é grande a chance de esse processo acelerar. O Estado age parcialmente, pois não tem capacidade técnica para monitorar o acusado e a vítima”, diz a psicóloga.

Ela defende o monitoramento do agressor por meio de mecanismos eletrônicos, como tornozeleiras capazes de rastrear o paradeiro dele. Dispositivo semelhante já é usado nos Estados Unidos. “Sem esse controle, o fim pode ser como o da cabeleireira. Nem a câmera impediu que ela fosse assassinada”, diz Marlise, referindo-se a Maria Islaine de Morais. Ela foi executada pelo ex-marido em janeiro de 2010, dentro do próprio salão de beleza, em BH.

A estatística citada pela especialista, apontando que 98,3% dos crimes contra as mulheres ficam ocultos na RMBH, foi obtida por meio do cruzamento de reclamações registradas por entidades de assistência às vítimas com números oficiais da polícia repassados ao Centro de Estudo de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp) da UFMG. “As vítimas ficam com medo de denunciar. Quando vêm a público contar um caso particular de violência doméstica, estão com a autoestima no limite. É o último recurso diante do medo de que aconteça algo mais grave”.

Na capital, a Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher registrou 8.768 ocorrências em 2011. A maioria por ameaça (3.192), seguida de agressão (2.191) e lesão corporal (1.358). Houve 28 tentativas de homicídio. No ano passado, foram enviados à Justiça 8.339 pedidos de medidas protetivas, 218 acusados foram presos em flagrante e foram expedidos 55 mandados de prisão. “Grande parte das vítimas é de classe social mais baixa e não denuncia por medo. Além de facilitar a fiscalização, a tornozeleira eletrônica daria mais segurança às denunciantes e aos parentes”, avalia a titular da unidade, delegada Elizabeth Freitas.

A coordenadora do Nepem ressalta que a violência doméstica não escolhe classe social. “É um fenômeno democrático, que acontece cotidianamente, com requintes de crueldade, como mulheres queimadas por ferro de passar roupa. Quando elas não morrem, ficam com sequelas”, afirma Marlise.

O presidente da Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis), Bruno Terra, reconhece a necessidade de meios para monitorar o cumprimento das medidas protetivas. “Não apenas a tornozeleira, mas qualquer outro dispositivo. Precisamos de instrumentos legislativos e de dotação orçamentária que permitam o acompanhamento das penas. Podem ser vários modelos, ligados ao Executivo estadual e ao Judiciário”, afirma. A Secretaria de Estado de Defesa Social informou que a escolha do fornecedor das tornozeleiras deverá ser feita neste mês. A prioridade será para o monitoramento de presos do regime semiaberto, mas os aparelhos deverão ser usados, posteriormente, por acusados na Lei Maria da Penha.

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