Aposentados mineiros na mira da ‘indústria dos benefícios’
Cartas e telefonemas aos pensionistas prometem pagamento de diferença de até R$ 82.080
A possibilidade de revisão de valores da aposentadoria determinada pela Justiça e acatada pelo Governo federal abriu uma brecha para a criação de uma “indústria dos benefícios”. Várias empresas se colocam a serviço de aposentados que queiram saber se têm direito a uma mudança no valor recebido. No entanto, eles podem ser induzidos a contrair empréstimos consignados ou dívidas para se associarem ou adiantar dinheiro para que o processo seja aberto, mesmo sem saberem se têm direito à revisão.A ação dessas empresas ditas especializadas começou a tomar mais força após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou à Previdência Social que pague, a partir de agosto, benefícios corrigidos para cerca de 130 mil segurados em todo país que se aposentaram pelo teto no período entre 5 de abril de 1991 e 31 de dezembro de 2003.
Diante dessa decisão, que não irá beneficiar a todos, aposentados mineiros começaram a ser bombardeados por correspondências e telefonemas de empresas. Pelas promessas (ver fac-símile), o aposentado é induzido a acreditar que pode ter direito a um reajuste em seu benefício de até 78,92% e diferenças que não foram pagas nos últimos anos que podem chegar a R$ 82.080. As cartas sugerem que as empresas estariam tendo acesso à base de dados do INSS, o que foi negado pela assessoria do órgão em Minas sob a alegação de que se trata “de sistema fechado sem permissão de acesso a servidores”.
De acordo com o procurador jurídico da Federação dos Aposentados e Pensionistas de Minas Gerais (FAP/MG), o advogado Diego Franco Gonçalves, essas empresas estão agindo de má-fé. “Em casos de contratos para ações de risco, ou seja, sem garantia de ganho de causa, não existe pagamento adiantado de valores”, explica.
Segundo ele, em escritórios sérios, o aposentado irá saber na hora se ele se enquadra ou não na decisão do STF. “Em caso negativo, não tem porquê pagar para se associar a uma empresa, assinar um contrato que não lhe trará nenhum ganho, e pagar por uma ação que não terá resultado positivo”, esclarece.
O presidente da Associação dos Eletricistas Aposentados (AEA-MG) de Minas Gerais, Milton Pinto de Andrade, avalia como “um mistério” como essas empresas têm acesso aos dados dos aposentados. Segundo ele, para colocar os beneficiários “contra a parede” e aguçar sua curiosidade, as cartas estabelecem prazos e horários para atendimento. “Nossa orientação é que não caiam nesse golpe. Procurem a AEA para que seja verificado se tem direito à revisão pelo teto”.
Andrade frisa que não será pedido qualquer antecipação de pagamento ou entrada financeira para verificação dos direitos na associação. O advogado Vilson Antônio da Silva, do escritório José Orlando Rios – conveniado com a AEA – confirma “uma verdadeira indústria de revisão de benefícios”. “Para dar andamento ao processo, são pedidos adiantamentos pagos até com parcelamento em cartão de crédito”, afirma.
Após denúncias, o Hoje em Dia esteve na filial da empresa paulista Prodac ( Programa de Apoio e Defesa ao Consumidor) em Belo Horizonte, na quarta-feira, onde havia cerca de dez aposentados à espera de atendimento. No local, J.S.P., de 76 anos, morador de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, revelou que, apesar da aposentadoria de R$ 1.076 – que, segundo especialistas, não lhe daria direito ao benefício – contraiu uma dívida de R$ 696,86 para se associar à empresa, além de uma empréstimo consignado de R$ 1.096 como adiantamento para tocar o processo.
No local, a mulher de um aposentado que desistiu do processo e queria um documento de volta chegou a acionar a Polícia Militar, que lavrou um boletim de ocorrência depois que a empresa se comprometeu a devolvê-lo no prazo de 48 horas. Vários aposentados disseram estar desconfiados e acabaram desistindo.
Pedro Paulo, que se apresentou como assessor de imprensa da Prodac, negou, na quinta-feira, por telefone, qualquer irregularidade por parte da empresa. Segundo ele, a Prodac atua com 25 tipos de ações e só assina contratos com aposentados que têm direito à revisão do benefício.
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